1. |
Moira
04:34
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Onde estará
a tesoura do destino?
Pra cortar as pontas soltas
que deixei pelo caminho,
pra cortar dedos de prosa
que nunca foram ditos,
desfazer todos os nós
que se prendem em si mesmo,
soltar as linhas mortas
fazer andar o tempo.
Onde encontrar
linhas novas que se prestem
a embolar o meu destino
remendar os meus lamentos
fechas casas que não servem
alinhavar ausências
dar sentido a carreteis
pregar novas memórias
coser os dias lentos
ajustar todas as horas?
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2. |
Incêndio
04:31
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Oito horas da noite
chove na cidade
chove na passagem
já há eras
erráticas e singelas
erráticas e singelas
voltagem futura
no estampido de um raio
um plug ligado na tomada
de um velho aparelho de som
prestes a incendiar tudo
no meio da tempestade
uma descarga elétrica
da sua imagem
uma descarga elétrica
da sua memória
fuligem na paisagem
carvão de quina
um gato com pneumonia
nem uma fotografia
sobrou
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3. |
Sugar High
05:20
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Os velhos romances
é preciso comê-los
é preciso comê-los inteiros
para que possam morrer
Morrer de desgosto,
de fome, veneno
de saco cheio
de ser, de ter, de crer
desinteresse desprezo
Os romances, é preciso comê-los inteiros
para que morram
para que morram
de vez
Aos bocados enfiados na boca
granulados os romances
enjoam
Os romances renascem se sobram na geladeira
Na boca seca, sedenta
os romances não matam a sede
os romances não fazem as vezes
de alimento
Os romances, é preciso comê-los inteiros
inteiros para que morram
que morram
que morram
que morram ligeiros
Dos romances
é preciso livrar-se
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4. |
Lunar
03:32
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Eu falo de você
mas não pra você
você fala de mim.
Na sua
memória
a nossa
história
é sua
é sua
é sua
não minha.
Na hora de falar
quando quiser voltar
não volta
não volta
não volta
o meu
o seu
o meu amor.
E se quiser chorar
ninguém vai se importar
que bom será.
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5. |
Vênus
08:07
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Nunca te dei um colar de conchas
nem pérolas pra enfeitar as ondas
ausentes em teus cabelos.
Eu não te escrevi declarações
de amor ou de renda.
Nem lembro se o teu leão é de ascendência ou de lua.
Nós nunca tivemos umcarroumacasadoisfilhosquintaisamoreirasumcão
Nunca enterramos um cão.
Mas lembro dos teus sapatos
tuas unhas em fotos legendas da minha canção
favorita
você saindo do mar.
Nunca te fiz um colar de contas
sentada na beira do mar esperando pra ver
da onde vinha você
se vinha pra me encontrar.
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6. |
Entidade Absoluta
07:41
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Eu queria morar num rio
todo feito de tempo
deleite
deitar num rio
todo feito de tempo
descansar no leito do tempo
deleite
Morar num rio
todo feito de tempo
deitar num rio
todo feito de tempo
deleite
descansar no leito do tempo
deitar num rio
todo feito de tempo
deleite
descansar no leito do tempo
deleite
ter só o rosto de fora
para poder respirar.
Deitar num rio
todo feito de leite
gaseificado, corrente
deixar ir o leito e me levar
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7. |
Marítimas
03:56
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Bolacha do mar
esperar a maré baixar
sentir esporádicos doces
num infinito de água e sal
sentir esporádicos doces
num infinito de água e sal
Conchas nas mãos
pedras nos pés
peixes, caranguejos escorpiões
coronárias constelações
peixes, caranguejos, escorpiões
coronárias constelações
Espumam
brumas do mar
eclipsam
peixes caranguejos, escorpiões
coronárias constelações
alçar vôo no bico do corvo
constelar
perder a cabeça no ar
mergulhar
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8. |
Você Chegou (BOT)
03:05
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I
Você chegou
Você
Você chegou/você chegou
chegou
é o imponderável
Você
Você chegou é o imponderável
Você
Você chegou?
Chega
Chega
Você chega
chama
você me chama
é dia
Você no correr do dia
chega na casa
chega vazia
você chegou
Chega
inanimado
II
Você vem
vem
você
você vem
vem
vem vindo
você vindo
vem
vê vendo vindo
indo
você indo
vindo
eu
indo
vejo vindo você
que vem
vindo
eu afundo
afundo
afundo
eu afundo
eu
eu temo
eu me afundo
eu
eu me afundo em temores
.
.
.
você não
III
a fenda em mim afunda
a espera de um mestre zen
.
Dois
Dois barcos afundam
afundam fendas
atol
afundam fendas
canais
afundam fendas finas
em mim
apostam corrida
canais
Dois barcos apostam corrida
mais!
Dois barcos apostam
uma mancha
apostam
a espera
mancha
a espera
mancha
uma mancha
no canal
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Patricia Nardelli Porto Alegre, Brazil
Patricia Nardelli produz criações em dança contemporânea, poesia, voz e corpo e música. Artista da cena, interessada sobretudo nas relações entre corpo, espaço e som. Tem as práticas meditativas e as técnicas somáticas como principais ferramentas de trabalho. ... more
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